terça-feira, 16 de março de 2021

Uma certa noção de tempo


Uma certa noção de tempo

Papo sempre descontraído e cheio de sorrisos. Alguém me desminta se cachorros não sorriem. Quem tem o seu, sabe que é verdade. Chego em casa e quando encosto o carro na calçada, Gugu e Bidulho logo dão sinal, me observando pelas grades do portão. Latidos e rugidos fortes, como quem comemora a chegada de alguém há muito esperado. Pulos, lambidas e tal.

Dialogar é algo importante. É claro, normalmente com pessoas, mas às vezes torna-se maçante até mesmo intragável se for assunto político polarizado, moda dos dias de hoje. Troquemos então de pessoas, é o meu conselho. Pronto! Aumentamos a solidão e perdemos amigos. Nada viável. Mesmo assim, às vezes não dá mesmo para ouvir certas coisas e nos fazermos de educados. É muito mais gratificante nesses casos, para mim, dar atenção a meus cachorros. Até com passarinho ando falando.

O fato é que cachorros têm uma parte da memória muito curta curta e não sabem quanto tempo ficamos fora, porque é uma alegria só, quando voltamos, não importa o tempo. Quando retorno de uma longa viagem, de dois ou três meses, eles agem com a mesma expressão de carinho de todos os dias, como se eu tivesse saído de manhã e voltado à tarde. Nada dizem nem perguntam do tempo que fiquei fora. Com certeza não.

Comportamento semelhante ao contrário percebo em minhas esposa e filhas. Quando retorno de longo interstício, elas, num primeiro momento, derramam aquela saudade de meses a recuperar, mas dois dias depois, as mesmas caras e bocas. Como é boa essa rotina! E as coisas do dia a dia voltam todas a seu lugar, o supermercado, os horários da escola, os quartos a arrumar, a casa, as contas a pagar.

Então, num dia comum, quando vou para o labor diário de um servidor público, novamente são pulos e lambidas, latidos, grunhidos. Expressões de carinho e apreço em que demonstram toda alegria pela minha presença, ignorando que logo estarei de volta. Por isso ficam tão felizes e expressam tudo que podem, pois, com razão, não sabem quando voltaremos ou se novamente nos veremos.

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