domingo, 6 de agosto de 2017

Cariacica É Underground

Cariacica É
Underground





Parafraseando Guimarães Rosa, “nossa Cariacica são muitas” e nossas identidades não se perdem no meio urbano, pelo contrário, criam-se identidades urbanas, mesmo que dentro de uma forte influência contemporânea onde se vê a homogeneização de comportamentos.

Desde o final do século XX debatemos sobre a retomada ou proteção das culturas tradicionais em meio ao avanço da massificação cultural, impulsionada pelo incremento das comunicações. Mas nessa miscelânea humana e tecnológica, as demarcações políticas e geográficas formam territórios com identidades próprias e objetivos com boa definição.

Em nossa região metropolitana (Grande Vitória), observamos diferenças nos comportamentos que são moldados pelas vivências dos diversos grupos. Em Cariacica, por exemplo, entre Cariacica Sede e Campo Grande ─ este, o maior centro comercial do município e polarizador da cultura local, percebemos interesses, manifestações e reivindicações próprias. Assim também entre Roda D’água com seu tradicional congo, na zona rural, e Flexal 1 e 2, com o hip hop que fala das mazelas das periferias urbanas, com culturas locais muito diversas, tendo suas próprias demandas de consumo e criação.

A construção dessas identidades também sofre a influência da percepção estrangeira. O olhar depreciativo e preconceituoso de fora que possa existir, ou valorativo e incentivador, certamente compõem a construção dessas identidades, seguindo o mesmo padrão já estudado na psicologia, em que indivíduos se comportam tendo como parâmetro as expectativas do outro. 

Hoje em Cariacica existe um forte movimento de cultura jovem de rua, uma cultura contemporânea e underground que desde o final da década de 80 se manifesta e influencia comportamentos em toda Grande Vitória. 

Sua estética repercute um movimento mundial, mas que demonstra vontade de alcançar valores próprios, independentes e autênticos. Por isso o movimento underground em Cariacica dá tão bons frutos nas diversas artes humanas ─ na literatura, na música, nas artes cênicas, nas artes visuais, etc. Blogs de cultura, como o Palhetadas do Rock, grupos de música autoral como o Resistência Hard Core e o Brígida de La Penha, grupos de teatro como o Motim, que leva consigo os ideais do movimento anarquista; coletivos que realizam oficinas culturais em comunidades carentes, criando cineclubes de temática ambiental e formando jovens na iniciação às artes. 

Artistas cariaciquenses premiados nacionalmente, como Dílio Lyra e o grupo Cia Panc de Dança, fazem parte desse movimento que tem também como protagonista uma parcela do poder público materializada na atual secretaria de cultura, que efetivamente ocupou importante espaço de fomento, assumindo o que a Organização das Nações Unidas (ONU) já proclamou: a cultura como um dos pilares do desenvolvimento. 

Essa é a Cariacica underground, moderna e pós-moderna, tradicional e contemporânea, que segue o desejo de distinção, de oposição e de ser ela própria, como esclareceu o antropólogo Claude Lévi-Strauss sobre identidade e diversidade, muito bem lembrado por Clarisse Libânio em seus estudos de cultura, e que nos faz perguntar onde nos encaixamos, se no “ou isto, ou aquilo?”, da Clarisse Lispector, ou no “tudo ao mesmo tempo agora”, do Arnaldo Antunes. 

Viva nossa Cariacica underground! 

Jacques Mota 
Jornalista


2 comentários:

  1. Parabéns pela qualidade do artigo Jacques. O mais incrível é perceber a atualização da cultura tradicional como uma resistência frente ao novo, incessantemente demandado. Nesses tempos de globalização, com tendências à padronização para melhor controle, a ação pró regional se faz necessária.

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    1. Obrigado Cíntia, é uma honra ter seu comentário por essas bandas... um grande abraço a você e nosso amigo Ernesto...

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As Palhetadas agradecem!